ALOCUÇÃO DE SUA SANTIDADE O PATRIARCA KIRILL DE MOSCOVO E TODA A RÚSSIA, APÓS A SUA ENTRONIZAÇÃO NA CATEDRAL DE CRISTO O SALVADO

   
 

 

Vossas Beatitudes, Primazes e Representantes das Santas Igrejas de Deus,
Estimado Presidente da Federação Russa Dmitry Anatolievich Medvedev,
Respeitável Presidente do Governo da Federação Russa Vladimir Vladimirovich Putin,
Estimados Chefes de Estado e Representantes dos Estados,
Povo Ortodoxo integrado no seio do Patriarcado de Moscovo,
Representantes de outros países,
Reverendíssimos Irmãos Hierarcas,
Honoráveis padres, madres abadessas,
Caros Irmãos e Irmãs em Cristo!

Pela vontade do Espírito Santo e dos membros do Concílio Local da nossa Igreja, eu, indigno, fui elevado pelos meus irmãos ao Trono Patriarcal de Moscovo e Toda a Rússia e deles recebi as insígnias da dignidade patriarcal. As vossas orações e os vossos rostos amáveis exortaram-me hoje, antes do começo do meu ministério patriarcal, tarefa que não será fácil, nem simples. O Senhor e a Igreja colocaram sobre mim uma cruz pesada, encargo que exige dedicação e compromisso completos ao ministério a que sou chamado, tendo sido [de acordo com o ritual] sentado por três vezes no trono Patriarcal. Não é por acaso que o grande paraman (espécie de escapulário patriarcal próprio) é colocado nos ombros do Patriarca, pois ele é um símbolo da renúncia a tudo, excepto ao ministério patriarcal, um símbolo da prontidão para a fidelidade a Deus até ao fim, através da obediência à Sua vontade, à semelhança d’Aquele que “Se humilhou e foi obediente até à morte e morte de cruz” (Filipenses 2,8).
Não há espaço para nada pessoal ou privado na vida do Patriarca: ele e o seu ser inteiro pertencem absolutamente a Deus e à Igreja, o seu coração sangra pelo povo de Deus, especialmente por aqueles que se afastaram da unidade da Igreja e por aqueles que ainda não encontraram a fé. O ministério patriarcal é um exercício espiritual especial. É impossível executá-lo sozinho ou limitado à ajuda de um círculo restrito de pessoas da mesma opinião. Todos os bispos e a Igreja inteira com a variedade de dons dos seus membros estão envolvidos na realização deste exercício por intermédio da comunhão de orações e de trabalhos conciliares.
Deste modo, estando consciente da minha indignidade e com temor interior, ascendo ao trono patriarcal e humildemente me confio à intercessão dos meus santos antecessores, os Metropolitas de Kiev e Moscovo, diante do altar do Deus. Vejo com o olho da minha mente os Santos Primazes da nossa Igreja, particularmente aqueles que desempenharam o seu ministério nos tempos modernos, começando com São Tikhon, o Confessor e terminando em Sua Santidade o Patriarca Alexis II de bem-aventurada memória.
O Patriarca é guardião da unidade interior da Igreja e preserva a pureza da fé juntamente com os seus irmãos bispos. A Entronização Patriarcal terá lugar no dia de comemoração de São Marcos de Éfeso, um audaz defensor e campeão da Fé Ortodoxa, e tomo isto como um sinal especial de Deus. A tarefa do Patriarca é  de não permitir facções, que, segundo o Apóstolo, “tenderão necessariamente” (1 Coríntios 11,19), para se transformarem em cismas, desordens e falsas doutrinas. O Patriarca deverá zelar por cada pessoa com todas as suas características únicas que as habilitam a encontrarem o seu lugar no corpo de igreja e, ao mesmo tempo, evitar que as facções transgridam o espírito do amor ou enfraqueçam os nossos esforços comuns para edificar a casa de Deus. As palavras de São Vicente de Lerins – “unidade naquilo que é importante, liberdade no que é secundário e finalmente amor em todas as coisas” – deveriam ser o princípio director da vida da Igreja.
O Patriarca é o defensor das fronteiras canónicas da Igreja. Este ministério torna-se especialmente significativo na situação emergente após a formação dos Estados independentes no território da “Rússia histórica”. Respeitando a sua soberania e zelando pelo seu bem-estar, o Patriarca é ao mesmo tempo chamado a preocupar-se com a manutenção e a fortalecimento dos laços espirituais entre as pessoas que vivem nesses países tendo em vista a preservação do sistema de valores que a civilização Ortodoxa una da Santa Rússia revela ao mundo.
A pregação da Igreja de ideais espirituais e morais aplicada às realidades da vida presente estará entre as preocupações particulares do Patriarca. O testemunho da verdade e a beleza da Ortodoxia podem tão-somente ser percebidos quando as pessoas entenderem claramente o significado deste testemunho na sua vida privada, familiar e pública e aprenderem a combinar as palavras eternas de Deus com as realidades da sua vida diária com os seus cuidados, alegrias e tristezas.
Combinar a Fé Ortodoxa e a Moral do Evangelho com os pensamentos diários e as esperanças das pessoas significa ajudá-las a responder às mais difíceis perguntas filosóficas e éticas do nosso tempo. A Fé será compreensível e com verdadeira exigência, independente da variedade e discrepância de visões e convicções na sociedade, somente quando as pessoas se capacitarem e sentirem profundamente a inquestionável rectidão e poder da mensagem que o Próprio Deus envia ao povo na Sua revelação. Os pensamentos humanos e as palavras humanas não podem ser mais fortes do que a Palavra do Deus. Se esta verdade óbvia não for evidente para muitas pessoas, isto significa que a beleza e a persuasão da Palavra Divina são obscurecidas por aquilo a que hoje chamamos “o factor humano”.
O testemunho da Igreja ao mundo pressupõe não apenas o sermão na igreja, mas também um diálogo aberto, amistoso e interessado, no qual ambos os lados falam e escutam. As verdades da fé tornam-se no mínimo compreensíveis por este diálogo, à medida que entram no contacto criativo e vivo com os pensamentos e as convicções das pessoas. A Igreja enriquece-se por este diálogo com o conhecimento daquilo que são as pessoas contemporâneas com o seu modo de pensar e as suas questões à Igreja.
Esta espécie do diálogo facilita um maior entendimento entre povos de diferentes visões e convicções, incluindo as suas crenças religiosas, e promove a consolidação de paz e concórdia nas nossas sociedades e estados. As relações entre a Igreja e o Estado deveriam desenvolver-se no quadro de um diálogo amistoso e uma cooperação com base na Constituição para servir ao bem da Igreja e do Estado e o bem do Povo.
Os Primazes de todas as Igrejas Locais são chamados a cuidar da unidade da Ortodoxia Universal juntamente com os seus irmãos de outras Igrejas. Agradeço aos primeiros Hierarcas e Representantes das Santas Igrejas Ortodoxas aqui presentes pelas nossas orações comuns, e declaro que estarei sempre aberto ao diálogo com as Igrejas irmãs para esforços comuns que nos ajudem a fortalecer e melhorar a cooperação em toda a Ortodoxia e alcançar melhor coordenação nos nossos esforços pastorais e missionários.
Zelaremos em particular da juventude que hoje carece terrivelmente de orientação espiritual. Numa época de relativismo moral, quando a propagação de violência e depravação rouba as almas da juventude, não podemos ficar pacientemente à espera do momento em que os jovens se voltem para Cristo. Temos de ir ao encontro dos jovens, não importa quão difícil seja para nós, das pessoas de meia-idade e da geração sénior, para ajudá-los a encontrar a fé em Deus e o significado da vida e bem assim a compreensão do que é a verdadeira felicidade. O modo de vida e o pensamento resultantes de fé sincera e profunda ocasionarão uma personalidade forte, uma família consolidada com muitos filhos e uma sociedade de solidariedade.
O nosso dever cristão é de zelarmos pelos que sofrem, os órfãos, os pobres, os inválidos, os idosos, os reclusos e os sem-abrigo – e todos aqueles que pudermos ajudar a encontrar esperança. A voz da Igreja deverá ser também a voz dos fracos e privados de direitos civis quem buscam a justiça.
Temos de fazer muito trabalho difícil. Evoco agora os santos ensinamentos do primeiro e do décimo quinto patriarcas. O Santo Patriarca Job escreveu: “É uma excelente acção construir e embelezar as igrejas; mas se ao mesmo tempo nos mancharmos pelas paixões, Deus não nos poupará a nós, nem às nossas igrejas”. “A nova Rússia ressurgirá das cinzas e do abismo pecador, como ele era; uma Rússia que gerou muitos zelotas de fé e piedade para o mundo; uma Rússia que constrói igrejas em cidades e aldeias e nos corações humanos; uma Rússia onde resplandece a verdade e o amor ao mundo – a Santa Rússia”. Possa Deus conceder que estas palavras inspiradas de Sua Santidade o Patriarca Alexis II se tornem proféticas.
Agradeço de todo o coração a todos que se reuniram para orar aqui. Espero que a vossa ajuda orante e a intercessão da Igreja inteira diante Deus nunca cessem. Dirijo as santas palavras de São Paulo a todos os hierarcas, padres e filhos da nossa Igreja: “ Irmãos, sede perfeitos, de bom entendimento, de uma só mente, vivei em paz, e o Deus de amor e da paz estará convosco” (2 Coríntios 13,11). Amen.

 

 
   
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