IGREJA ORTODOXA DE PORTUGAL

ESCOLA DE ICONOGRAFIA NO BRASIL

FUNDADA PELO ARCIPRESTE FRANCISCO DE ASSIS DA CRUZ FEITOSA

 

 

Uma das vertentes profícuas que destacamos - entre tantas que poderíamos aqui enumerar - do trabalho na Igreja Ortodoxa do Brasil, é a Escola de Iconografia fundada pelo Senhor Arcipreste Francisco  de Assis da Cruz Feitosa, em Brasília, que conta com algumas dezenas de alunos, solidamente motivados pelo seu zeloso exemplo, mostrando que, com tão pouco - quando se quer e se ama verdadeiramente, tanto se pode fazer .

A Iconografia ­− que na Ortodoxia consiste na pintura dos Santos Ícones Ortodoxos − é uma arte sagrada, de natureza espiritual, visando transmitir a beleza e majestade de Deus, refletidas nos Seus Santos.

A Tradição Ortodoxa incorporou a arte na sua vivência espiritual, na medida em que a Beleza é um dos nomes de Deus e onde há beleza há harmonia e Deus está presente. A Ortodoxia reconhece Deus como o primeiro artista: "E Deus disse: haja luz. E houve luz. E viu Deus que era boa a luz". Deus criou o mundo e viu que era bom! O Criador de todas as coisas fez sua obra contemplou-a, portanto a arte tem a função sagrada de nos transmitir uma verdade; desta verdade decorre a beleza de uma obra. Nesse sentido, a Arte Sagrada ocupa um lugar de primeira ordem como verdade teológica e como transfiguração deste mundo pelo reflexo do amor divino.

1. Ícone: Imagem do Invisível
Os Ícones são característicos da Arte Sagrada e Litúrgica da Igreja Oriental. Quando penetramos num templo ortodoxo imediatamente percebemos inumeráveis ícones por toda a Igreja. É que o ícone é sinônimo de Arte Sagrada Bizantina, onde teve a sua origem e o seu aperfeiçoamento, embora não esteja restrito a um lugar geográfico.

Bizâncio irradiou esta arte por todo o império Cristão e hoje encontra-se em todas as Igrejas Ortodoxas espalhadas pelo mundo. A atualidade do ícone é surpreendente. Há um movimento de redescoberta das fontes da Cristianismo e o Ocidente Cristão cada dia se extasia mais profunda e solenemente e se surpreende com a riqueza dos ícones. Estes têm um lugar e papel importantíssimo para a espiritualidade ortodoxa que relativamente à qual podemos compreender o lugar que ocupa o Ícone, já que não existe nada semelhante na tradição religiosa ocidental, seja na forma artística, seja no conteúdo espiritual. De facto, para o Ocidente Cristão, o ícone é desconhecido e incompreensível até que se percebe e compreende a sua função e sentido. É isto que nos propomos aqui, uma aproximação e penetração no mundo do Ícone.

2. O que é um Ícone?
Esta é uma indagação básica que se faz em geral. A palavra ícone vem do grego EIKÓN, que significa imagem, palavra com amplas aplicações e que no Ocidente é extensiva às figuras com volume ou estátuas que representam o Cristo ou os santos. O Oriente Cristão não produz imagens volumétricas ou estátuas por considerar o volume como um passo para antropomorfizar a representação e resvalar  para a idolatria. Um Ícone, portanto, é simplesmente uma imagem pintada sobre a madeira, com técnica muito especial e de acordo com cânones bem definidos quanto ao tema, composição, cor, e harmonia que se pretende pintar.

3. O que não é um Ícone?
Para o Cristão ortodoxo é difícil definir o que é um ícone, porque para eles o ícone é uma experiência pessoal, a contemplação através da pintura. Portanto, só podemos defini-lo negativamente, ou seja, não é um retrato, não se pintam sentimentos ou emoções. Não se adora o ícone, não há risco de idolatrar a pintura, pois essa representa uma imagem - um protótipo, um modelo - na realidade, venera-se a pessoa representada, não o objeto em si. O Ícone é uma presença misteriosa que não se define. O Ícone não é um simples estilo artístico nem um modo histórico de arte, não está preso a um tempo específico.

4. Qual o Fundamento do Ícone?
No Antigo Testamento Deus proibiu qualquer representação ou imagem divina (Ex.20). A pedagogia Divina levou os hebreus primeiro a escutar a voz de Deus (Dt. 4, 12-15). Começa aqui o início da experiência pessoal com Deus. Não se podia representar Deus porque Ele nunca fora visto por ninguém. Os homens são conduzidos e preparados para o encontro verdadeiro com Cristo, que nos revela a verdadeira imagem de Deus. "Cristo é a imagem de Deus invisível" (Col. 1, 15). É na Encarnação do Verbo de Deus feito homem que podemos pintar sua imagem. Sendo o ícone a revelação do Invisível, a Iconografia é aos olhos o que a palavra é para o ouvido.

5. Qual a Função do Ícone?
O ícone tem uma função sacramental, na medida em que reflete o divino, o atemporal e nos remete para a eternidade, da qual o ícone é uma janela permanentemente aberta. O Ícone possui uma beleza que não reside na estética do quadro, mas sim na verdade teológica que nos comunica.
Não tem nem sequer função didática de ensino religioso, embora possamos aprender com ele.
O que o Evangelho proclama com a palavra, o Ícone anuncia-o com cores e torna-o presente. Nas palavras de São João Damasceno, "o Ícone é um canal de graça com poder santificador", na medida que nos comunica a Luz Divina, atributo da glória do Reino de Deus. Diante do Ícone o recolhimento e o silêncio abrem os nossos olhos à luz da transfiguração e permitem-nos contemplar uma beleza que não é deste mundo. O Ícone é um testemunho do Poder Santificador do Espírito Santo na santidade dos santos e a certeza de que os homens podem seguir o mesmo trilho aberto por Cristo.

6. História dos Ícones
É difícil definir quando começou a pintura de ícones. Uma tradição muito difundida e ancestral atribui os primeiros ícones ao evangelista São Lucas, que sendo muito amigo da Virgem Maria Mãe de Deus, teria pintado vários ícones da Virgem, que gostou muito, abençoou e agradeceu.
Outra tradição relaciona os ícones com a imagem aerobita (Santa Face não pintada por mão humana) enviada por Cristo ao rei Abgar de Edessa. A lenda menciona que Abgar estava leproso e queria curar-se. Enviou uma delegação à Palestina pedindo a Cristo cura e uma imagem Sua. Cristo atendeu e enviou-lhe um pano onde tinha enxugado o rosto e aí ficaram impressos os Seus traços.
Há uma tradição latina que menciona um episódio da Paixão de Cristo. Diz que Santa Verônica (que talvez signifique "vero ícone", verdadeira imagem) enxugou o rosto do Senhor, tendo esse pano retido a imagem de Cristo.
Houve Concílios que regulamentaram a confecção dos Ícones, como o de In Trullo em 691, que defendeu uma doutrina cristológica do Ícone. Mas o Ícone viveu um período de contestação chamado precisamente de iconoclasta, ou seja, destruidor de Ícones. A guerra às imagens foi declarada pelo Imperador bizantino Leão III, em 725. As sagradas imagens foram condenadas, dando lugar à perseguição, morte e desterro dos defensores dos Ícones. Essa guerra foi declarada sob acusação de idolatria e esta querela durou mais de um século. Mesmo assim, em 787 celebrou-se o Concílio de Nicéia, que condenou os iconoclastas e justificou o culto dos Ícones.
Por fim, em 843, no primeiro Domingo da Quaresma, através da Imperatriz Teodora, foi restabelecida veneração às imagens, e celebrada solenemente nesta ocasião o "triunfo da Ortodoxia". Esta festa celebra-se ainda hoje todos os anos e é denominada "O Dia da Ortodoxia".

7. Quem Pinta os Ícones?
O Ícone só tem fundamento na Igreja, ou seja, é dentro da Tradição da Igreja Ortodoxa num contexto especial que surge o Ícone. O iconógrafo é alguém autorizado e avaliado por uma autoridade da Igreja para tal propósito; segue uma aprendizagem artística específica, quanto à técnica propriamente dita e segue recomendações espirituais, para poder realizar a sua obra: orações, jejum, leitura e meditação bíblica.
O pintor de Ícones ou iconógrafo, deve ser humilde, manso e piedoso - não deve ser charlatão, nem briguento, nem invejoso, nem bebedor, nem ladrão. Deve guardar a pureza espiritual e corporal.

8. O Iconógrafo e a Tradição
É importante frisar que o iconógrafo tem o seu fundamento na Tradição espiritual da Igreja. Esta define não como conservação de uma herança passada, mas bem como uma "transmissão", uma atualização da herança viva. O Ícone é uma das expressões da Tradição Sagrada da Igreja, o mesmo que a tradição escrita e a oral. O significado da palavra iconógrafo é "o que escreve os ícones" e deve ter uma preparação espiritual em contato direto com a Igreja, que o abençoa e orienta no seu trabalho artístico. Portanto, o conteúdo espiritual do ícone reside na fidelidade à tradição da Igreja, que define através de uma série de cânones e prescrições, os limites dentro dos quais o gênio do artista se movimenta, que é menos individual e muito mais teológico. No Ícone o artista (o iconógrafo) é quase anônimo, ele é um instrumento para o Espírito Santo agir, emprestando-Lhe o seu talento particular. Nenhum iconógrafo pretende ser "um artista original"; isto é completamente alheio à finalidade do Ícone e completamente estranho à Tradição da Igreja.

9. As Escolas Iconográficas
Existem muitas escolas iconográficas. As principais são as eslavas e as gregas, que deram origem a uma grande diversidade de escolas. [...] O ícone é uma obra de arte que ultrapassa a própria arte: longe de ser somente de ordem estética, a mensagem do ícone é de ordem teológica. E por isso o ícone fala aos homens de nosso tempo, assim como falou aos homens de outrora. Imagem do invisível, janela para o infinito, a iconografia nasce da memória dos primeiros cristãos e enraíza-se no evangelho e na liturgia. Apenas pela sua existência, cada ícone evoca o mistério da Encarnação.

10. Qual o significado do Ícone?
A arte do Ícone é um apelo para que o cristão que o contempla se distancie dele e purifique os seus sentidos, de tal modo que possa contemplar nessa manifestação artística a própria Pessoa divina [que vem] até nós sob uma forma humana, a de Jesus Cristo Nosso Deus e Salvador. No seio da Igreja Ortodoxa o Ícone recebe a mesma veneração que as Sagradas Escrituras, porque as imagens exprimem através das suas cores e do simbolismo das suas formas o mesmo que a palavra escrita nos anuncia. Isto é, o Ícone procura exprimir o inexprimível; e isso tornou-se possível desde que o Filho de Deus encarnou e Se fez Homem (na Antiga Lei era proibido fazer imagens por existir o perigo de idolatria, ou seja, da adoração dos ídolos: de facto, no Antigo Testamento Deus revelava-Se aos homens sobretudo através da Palavra - mas depois a Palavra fez-Se carne, com Jesus Cristo).
De certo modo podemos dizer que Cristo encarnou, tomou um corpo, para nos mostrar a figura "humana" de Deus-Pai - Ele que nos criou à Sua imagem e semelhança.
"Ícone" significa exatamente "imagem". Assim, o Ícone de um Santo representa a imagem, simultaneamente terrestre e celeste, desse Santo, a sua imagem pura e integral. Podíamos, aliás, dizer que no Ícone a imagem humana é pintada como ela era na origem, na Criação do Mundo, liberta das leis da matéria resultantes da Queda. O que o Ícone nos mostra não é uma realidade do Mundo que nos rodeia: é uma "janela" que se abre para o Céu. E a imagem aí representada é a de uma criatura celeste, rodeada de luz (é essa a razão do fundo dourado que vemos, geralmente, em cada Ícone).
No caso de um Ícone de Cristo, o que contemplamos não é a sua natureza divina nem a sua natureza humana; é, sim, o próprio Verbo de Deus encarnado, tendo o divino e o humano reunidos em Si. Deste modo, a fotografia de um santo dos nossos dias não pode servir de Ícone (isto é, de imagem sagrada) porque a fotografia é uma imagem exclusivamente terrestre do homem. O mesmo se poderia dizer das esculturas, igualmente representações exclusivas da humanidade de um Santo. E ainda por cima, susceptíveis de incitar o crente à idolatria.
Deve-se acrescentar que a veneração das Santas Imagens (Ícones) é um dogma de Fé, assim formulado pelo 7.° Concílio Ecumênico: "Os santos e preciosos Ícones devem ser colocados nas igrejas, casas, estradas, quer sejam Ícones de Nosso Senhor Deus e Salvador Jesus Cristo ou da nossa Soberana e sempre Virgem, a Santa Mãe de Deus, ou dos Santos Anjos e dos Homens Santos e Veneráveis. Porque, cada vez que vemos a sua representação pela imagem somos incitados a contemplá-los, a lembrarmo-nos dos modelos, e adquirindo assim mais amor por eles, somos ainda levados a render-lhes homenagem, beijando-os e testemunhando a nossa veneração, não a verdadeira adoração que, segundo a nossa fé, convém apenas à natureza divina, porque a honra dada à imagem vai directa ao seu modelo e aquele que venera um Ícone venera a pessoa que se encontra nele representada".

 
     
 


 
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